Uma decisão marcante está sendo proposta para o Fedora Linux 43, que promete redefinir o futuro da distribuição para milhões de usuários. Trata-se da descontinuação completa do suporte à arquitetura i686 (32 bits) em todo o sistema. Esta mudança radical afetará diretamente a forma como o Fedora lida com softwares legados, incluindo aplicativos e jogos populares que dependem de bibliotecas de 32 bits, como Wine e Steam.
A proposta do Fedora visa otimizar a distribuição, reduzindo a carga de manutenção, aprimorando a infraestrutura e beneficiando os usuários com repositórios mais enxutos e operações mais rápidas. No entanto, o impacto para quem ainda utiliza software de 32 bits será significativo, exigindo adaptação e, em alguns casos, a busca por alternativas.
Este artigo fará uma análise aprofundada da proposta do Fedora 43 de descontinuar o suporte ao i686, explorando os motivos, o processo de implementação em duas etapas (sendo a segunda praticamente irreversível), e, crucialmente, as implicações detalhadas para a compatibilidade de software, oferecendo orientações e alternativas para os usuários afetados.
O fim de uma era: por que o Fedora está abandonando o i686?
Contexto histórico e o dilema do multilib
O Fedora já vinha sinalizando há anos o seu afastamento do i686, uma arquitetura de 32 bits cada vez mais obsoleta. Com o Fedora 31, foram descontinuados os kernels i686 e os repositórios independentes i686, embora ainda fosse possível instalar pacotes de 32 bits via o sistema multilib em sistemas x86_64. Isso permitia que softwares antigos, como jogos no Steam ou aplicações Windows via Wine, continuassem funcionais.
Para iniciantes: multilib é a capacidade de um sistema 64 bits de instalar e executar bibliotecas de 32 bits, o que é essencial para rodar programas legados. Essa abordagem, no entanto, exige manutenção dobrada, já que os pacotes precisam ser construídos para ambas as arquiteturas.
A partir do Fedora 37, mantenedores passaram a ter permissão para parar de construir pacotes i686 que não fossem dependência direta de outros pacotes — os chamados leaf packages. Era o primeiro passo claro para encerrar a era do multilib.
A proposta do Fedora 43: os dois últimos passos
A mudança agora proposta para o Fedora 43 é mais drástica e vem em duas etapas:
- Passo 1 (reversível): os repositórios x86_64 deixam de incluir pacotes de arquitetura i686. Isso significa o fim do suporte multilib: nenhum pacote de 32 bits poderá ser instalado por padrão.
- Passo 2 (irreversível): o Fedora parará completamente de construir pacotes para a arquitetura i686. Nem mesmo builds internos ou opcionais estarão disponíveis.
A irreversibilidade do segundo passo se dá porque, uma vez removida toda a infraestrutura de build, seria necessário um re-bootstrap completo da arquitetura para restaurá-la — um processo complexo e oneroso.
Benefícios para o ecossistema Fedora
A proposta traz uma série de benefícios práticos e estratégicos para o Fedora e sua comunidade:
- Mantenedores de pacotes poderão focar em arquiteturas ativamente usadas, eliminando o esforço de compatibilidade com 32 bits.
- A engenharia de release (RelEng) ganha com repositórios mais simples e pipelines de build menos sujeitos a erros por heurísticas frágeis de multilib.
- A infraestrutura de build (Koji, Peridot) libera recursos valiosos para acelerar a construção de pacotes x86_64 e aarch64.
- Usuários se beneficiam com repositórios menores — aproximadamente 10 mil pacotes i686 a menos —, o que acelera o desempenho do DNF, melhora a responsividade de ferramentas como GNOME Software e KDE Discover, e reduz o consumo de banda.
Impacto na compatibilidade: o que muda para seu software legado
Remoção de pacotes i686 no upgrade
Ao atualizar para o Fedora 43, qualquer pacote i686 instalado será automaticamente removido, pois não estará mais disponível nos repositórios. Isso inclui bibliotecas específicas utilizadas por Wine, Steam e outros programas herdados.
Não haverá mais nenhuma forma oficial de instalar pacotes de 32 bits usando os repositórios padrão do Fedora.
Software de terceiros e dependências
Muitos softwares de terceiros — especialmente fechados ou desatualizados — ainda dependem de bibliotecas de 32 bits para funcionar. A mudança impedirá sua instalação, a menos que o desenvolvedor:
- Adapte o código para funcionar totalmente em 64 bits, ou
- Forneça os binários de 32 bits em containers, flatpaks ou outras soluções isoladas.
Além disso, desenvolvedores que mantêm pacotes no Fedora terão que atualizar suas configurações de build para remover referências a ExcludeArch, ExclusiveArch e outras macros de build específicas do i686, como %__isa_bits.
Wine e Steam: os mais afetados
Wine: transição forçada para WoW64
A principal alternativa para continuar rodando aplicativos Windows de 32 bits será o Wine em modo WoW64 — o chamado Windows-on-Windows 64-bit. Essa abordagem utiliza uma camada de compatibilidade pura em 64 bits para executar binários de 32 bits, sem depender de bibliotecas i686 do sistema.
Contudo, para que funcione corretamente:
- O Wine precisa ser reconstruído com suporte total ao WoW64.
- Wineprefixes antigos poderão não funcionar corretamente, exigindo que o usuário recrie o prefixo e reinstale os aplicativos.
Steam: repositórios afetados
A versão atual do Steam (cliente) depende fortemente de bibliotecas de 32 bits. Mesmo as versões empacotadas como flatpak ou via script podem enfrentar dificuldades se baseadas em dependências externas.
Há possibilidade de:
- O Steam ser removido dos repositórios de terceiros até ser adaptado.
- Os usuários precisarem recorrer a flatpaks autossuficientes, containers, ou utilizar distribuições alternativas que ainda suportem multilib.
Processadores i686: quais equipamentos perderão suporte?
Embora a grande maioria dos computadores modernos já utilize processadores x86_64 (64 bits), ainda existem alguns modelos mais antigos que operam exclusivamente com a arquitetura i686 (32 bits) e, portanto, serão diretamente impactados pela mudança no Fedora 43. Entre os processadores que não suportam 64 bits e ainda usam a arquitetura i686 estão os modelos das famílias Intel Pentium III, Intel Pentium M (primeiras gerações), Intel Celeron (linha Tualatin e alguns Mobile), AMD Athlon XP, AMD Duron, VIA C3, Transmeta Crusoe e outros chips de baixo consumo lançados até meados dos anos 2000. Esses processadores não são compatíveis com sistemas x86_64, e com a remoção do suporte i686 no Fedora 43, não será mais possível instalar ou atualizar o sistema Fedora nesses equipamentos, a menos que se utilizem distribuições alternativas que ainda mantenham suporte legado para 32 bits.
Benefícios a longo prazo
Apesar dos impactos imediatos, a decisão do Fedora:
- Alinha-se ao desenvolvimento upstream do Wine, que já está priorizando o suporte via WoW64.
- Reforça a tendência do ecossistema Linux de abandonar o suporte a 32 bits, algo que já foi feito por projetos como Ubuntu, Arch Linux, Debian (em parte), além de distros emergentes como Clear Linux e Vanilla OS.
- Abre caminho para novas arquiteturas modernas, como x86-64-v2 e RISC-V, ao liberar recursos e reduzir a complexidade do sistema.
Como testar e o plano de contingência
Como testar a mudança
O Fedora propõe que usuários e desenvolvedores participem ativamente da fase de testes:
- Realize um upgrade para a versão de desenvolvimento do Fedora 43 com os repositórios atualizados.
- Verifique se os pacotes de arquitetura i686 foram removidos corretamente.
- Tente instalar pacotes de 32 bits — eles não devem estar disponíveis.
- Teste o uso de Wine e Steam, validando se o suporte via WoW64 está funcional.
- Reporte problemas ao Bugzilla ou via canais de comunicação da comunidade Fedora.
Plano de contingência
O processo foi desenhado com etapas bem definidas para garantir controle e margem de erro mínima:
- Passo 1 (remoção de multilib): é reversível. A engenharia de release pode restaurar a configuração no sistema de build (compose) e reativar o suporte temporariamente.
- Passo 2 (parar de construir pacotes i686): não é reversível sem grande esforço, pois exigiria um re-bootstrap completo da arquitetura i686.
Cronograma
- A primeira etapa será implementada o mais cedo possível no ciclo do Fedora 43, antes da reconstrução em massa.
- A segunda ocorrerá pelo menos quatro semanas depois, antes do Beta Freeze.
- A release do Fedora 43 não será finalizada até que a mudança esteja totalmente implementada ou revertida.
Conclusão: Fedora 43 – um passo audacioso para um futuro mais eficiente
A proposta do Fedora 43 de descontinuar o suporte completo ao i686 (32 bits) é um passo audacioso e necessário para o futuro da distribuição. Ao reduzir a dívida técnica e otimizar a infraestrutura, o Fedora se prepara para ser ainda mais eficiente, moderno e leve. Embora impacte diretamente usuários de software legado, como Wine e Steam, essa transição segue uma tendência global e estimula o uso de tecnologias modernas de compatibilidade como o WoW64.
Se você utiliza o Fedora e depende de software de 32 bits, prepare-se para essas mudanças, explore as alternativas (como o Wine com WoW64) e contribua com feedback para a comunidade! Para mais notícias e análises sobre o Fedora e a evolução do Linux, continue acompanhando o SempreUpdate!
