Engenheiro cria servidor web “incrivelmente rápido” usando o chip de um vape descartável

Escrito por
Emanuel Negromonte
Emanuel Negromonte é Jornalista, Mestre em Tecnologia da Informação e atualmente cursa a segunda graduação em Engenharia de Software. Com 14 anos de experiência escrevendo sobre...

Do e-waste ao wow: um M0+ de 24 MHz, 24KB de Flash e SLIP servindo páginas em 160 ms.

Um engenheiro e artista de origami transformou o cérebro de um vape descartável em um servidor web surpreendentemente rápido, em um projeto batizado de VapeServer. A história soa como ficção científica — ou uma piada de laboratório — mas aconteceu de verdade e ganhou destaque no dia 15 de setembro de 2025. A reportagem do Tom’s Hardware acompanha a façanha do criador, Bogdan Ionescu (o “BogdanTheGeek”), e mostra como um pedaço de lixo eletrônico virou vitrine de engenhosidade maker.

a surpreendente tecnologia dentro de um vape

Dentro de um desses dispositivos descartáveis, Ionescu encontrou um IC marcado como “PUYA C642F15” que, após investigação, revelou-se ser um PY32F002B — um microcontrolador Arm Cortex M0+ de 24 MHz com 24KB de Flash e 3KB de SRAM. Parece pouco? É “centenas de vezes” mais lento que um celular antigo, mas suficiente para hospedar uma página inteira (o conteúdo do próprio post do autor) que “cabia por um triz” no espaço restante da Flash. O relato técnico completo está no post do blog do criador.

como ele colocou a nicotina na rede: SLIP + uIP

Sem Ethernet, sem Wi-Fi e sem milagre: a solução foi emular um “modem dial-up” no microcontrolador usando SLIP (Serial Line Internet Protocol) pela conexão USB-C do vape. No PC Linux, ferramentas como slattach e socat abriram o caminho para enviar/receber pacotes IP; do lado do vape, o stack uIP (minúsculo e sem necessidade de RTOS) deu voz ao TCP/IP e a um servidor HTTP mínimo. Parece gambiarra? É uma aula de criatividade aplicada — e está toda documentada no blog do projeto.

De 20 segundos a 160 milissegundos: a jornada da otimização

No começo, deu tudo errado: pings na casa de ~1,5 s e uma página que levava 20 segundos para carregar. Quem nunca pensou em desistir depois de um teste desses? Ionescu admite que o “vilão” era o próprio código. A virada veio com um buffer e escritas em lote para aumentar o throughput. Resultado: pings caíram para ~20 ms, sem perda de pacotes, e o carregamento da página desceu para apenas 160 milissegundos — um número que, no contexto, é de cair o queixo. A narrativa completa dessa “cirurgia de desempenho” está detalhada no Tom’s Hardware e no blog do autor.

do e-waste ao “uau”: por que o VapeServer importa

Há uma mensagem poderosa por trás do espetáculo técnico: aquilo que você joga fora pode esconder componentes com valor educativo e criativo enorme — baterias recarregáveis, PCBs com microcontroladores programáveis e, às vezes, portas USB-C prontas para experimentos. O VapeServer não é só uma curiosidade; é um lembrete de que a cultura maker floresce quando a gente olha para o lixo eletrônico como um laboratório portátil. E sim, o site “de verdade” chegou a ser servido pelo vape; a URL ewaste.fka.wtf ficou intermitente (respostas 503) quando a fama bateu à porta e o tráfego explodiu — o que, convenhamos, é um problema delicioso de se ter quando o seu “datacenter” é um M0+ de 24 MHz.

quer replicar? o código está aberto

Fiel ao espírito maker, Ionescu abriu o projeto: o “esqueleto” de rede e as otimizações estão publicadas no GitHub, no repositório semihost-ip — pensado para rodar TCP/IP em qualquer Arm via debug/SWD, com dependências simples e exemplos práticos (uIP, pyOCD, slip). Se você ficou com coceira nos dedos para tentar, comece por aqui: github.com/BogdanTheGeek/semihost-ip. O passo a passo e os porquês técnicos, incluindo escolhas de stack e truques de performance, seguem no post oficial do projeto.

No fim, a graça do VapeServer não está só no número mágico dos 160 milissegundos. Está no caminho: na curiosidade que desmonta um vape descartável, na teimosia que transforma latência em aprendizado e na generosidade de compartilhar tudo para que mais gente tente — e melhore. Afinal, quantos “servidores web” estão hibernando no lixo eletrônico da sua gaveta?

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