Sua empresa tem software demais? A conta chega em dinheiro, tempo e burnout

Ferramentas demais viram peso: a complexidade do software está drenando orçamento, produtividade e saúde das equipes.

Escrito por
Emanuel Negromonte
Emanuel Negromonte é Jornalista, Mestre em Tecnologia da Informação e atualmente cursa a segunda graduação em Engenharia de Software. Com 14 anos de experiência escrevendo sobre...

Sabe quando a empresa compra ferramenta para “ganhar velocidade” e, de repente, parece que tudo ficou mais lento? O relatório Cost of Complexity da Freshworks coloca números bem incômodos nesse sentimento. A tese central é direta: o excesso de plataformas, integrações frágeis e implementações mal resolvidas transformou a tecnologia corporativa numa espécie de pedágio permanente, um imposto silencioso cobrado em dinheiro, tempo e saúde mental.

Pense na rotina de um time moderno como uma maratona. Só que, em vez de shorts e tênis, ele corre com três casacos, duas calças e uma mochila cheia de ferramentas que ninguém domina. A promessa era “mais modernidade”. O resultado, muitas vezes, é peso morto.

A “taxa sobre o crescimento”: 20% do orçamento vai para o lixo

O primeiro choque é financeiro. O estudo aponta que empresas desperdiçam 20% do investimento em software por causa de complexidade de software, implementações que falham, ferramentas pouco usadas e custos inesperados. Em outras palavras: a organização paga por capacidade e termina operando no modo “remendo e gambiarra” porque ninguém consegue extrair o valor prometido.

E tem mais. A pesquisa estima que a complexidade organizacional e tecnológica drena, em média, 7% da receita anual. É um número que dói porque não aparece em uma linha óbvia da planilha. Ele se espalha em atrasos, decisões mal informadas, projetos que não escalam, e oportunidades que caducam enquanto alguém tenta reconciliar dados em sistemas diferentes.

Esses custos também criam um efeito colateral estratégico: dinheiro que deveria ir para inovação acaba consumido pela manutenção do labirinto. E aí a empresa entra num ciclo ruim, compra mais software para “resolver” o que o software anterior complicou, e a bola de neve cresce.

Um dia perdido por semana: a crise de produtividade

Agora vem a parte que qualquer gestor reconhece na prática. Segundo o relatório, funcionários perdem quase 7 horas por semana lidando com sistemas complexos e fragmentados. Quase um dia inteiro de trabalho jogado fora, não por falta de esforço, mas por excesso de atrito.

O estudo descreve um cenário comum: equipes usando, em média, muitas soluções diferentes e vários canais de comunicação ao mesmo tempo. Some a isso a falta de uma “fonte única de verdade” e você ganha o tipo de ambiente em que ninguém tem certeza de qual dado está certo, qual ticket é o mais urgente, ou onde aquela conversa crítica aconteceu.

O impacto pesa especialmente em áreas como TI e CX. Para CX, o problema aparece como fluxo de trabalho engessado, troca constante entre ferramentas e tarefas simples que viram burocracia. Para TI, a dor costuma ser integração difícil, soluções isoladas e experiências de uso antigas, aquelas interfaces que parecem de outra década, mas que seguram processos essenciais.

No fim do dia, não é só “perda de tempo”. É perda de foco. E foco é o combustível do bom atendimento, da boa entrega e de qualquer melhoria contínua.

Quando o software empurra pessoas para o burnout (e para a saída)

Aqui o relatório vai além da produtividade e acerta no nervo humano da transformação digital. A pesquisa indica que 60% dos funcionários consideram sair, pelo menos em algum grau, no próximo ano. E entre os fatores citados aparecem complexidade organizacional, processos complicados, burnout, e software ruim ou difícil de usar.

Repare na inversão: por muito tempo, o debate foi “as pessoas precisam se adaptar ao sistema”. Só que, quando o sistema vira um obstáculo diário, a adaptação tem custo emocional. Não é drama, é fisiologia. A pessoa passa o dia alternando login, copiando e colando dados, repetindo etapas, tentando descobrir onde está a informação certa. E, quando chega a hora de resolver o problema do cliente, a energia já foi embora.

Isso também explica por que implementações falhas são tão corrosivas. Um projeto entra atrasado, estoura orçamento, o suporte do fornecedor não ajuda, e quem absorve o impacto é o time interno. A percepção vira: “a empresa escolheu complicar minha vida”. E a confiança, que é base de qualquer mudança, desmorona.

“Complexidade é uma escolha”: simplificar como estratégia de crescimento

A frase do CEO Dennis Woodside resume o espírito do relatório: complexidade é uma escolha. É uma provocação útil porque tira a complexidade do lugar de “fatalidade”. Não é inevitável. Ela nasce de decisões acumuladas, compras por impulso, falta de governança, integrações improvisadas e a crença de que “mais software” significa “mais sofisticação”.

A saída que o relatório sugere não é cosmética. Simplificar não é “deixar bonito”, é recuperar velocidade. Isso passa por consolidar plataformas, reduzir redundâncias, exigir integração de verdade, medir ROI com rigor, e desenhar processos pensando em pessoas, não em organogramas. No fundo, é trocar o fetiche da ferramenta pela pergunta que importa: isso reduz atrito ou cria mais um clique?

Se a tecnologia existe para acelerar o negócio, qualquer ponto que drene tempo e energia vira uma meta de eliminação. E quando a empresa faz isso direito, ela não só economiza. Ela volta a crescer.

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