O Linux 6.18 acabou de chegar no mundo upstream, mas, para quem quer um sistema realmente alinhado ao software livre, o trabalho começa exatamente aí. O projeto GNU Linux-libre 6.18 lançou a edição “6.18-gnu”, um kernel 100% livre que pega o Linux oficial como base e faz um “de-blobbing” cuidadoso para eliminar dependências de blobs binários e firmware proprietário.
Aqui vale a distinção que muita gente confunde: Linux é o kernel que, em várias áreas, pode conter ou acionar componentes não livres; Linux-libre é o kernel “Linux-like” que remove esses elementos e desativa pedidos de blobs em tempo de execução, para que o usuário não seja conduzido ao software proprietário pela porta dos fundos.
Limpando os “microplásticos” do kernel
No anúncio do release, Freedo, o pinguim porta-voz do projeto, usa uma metáfora perfeita: blobs binários são como microplásticos. Eles parecem pequenos, “só um arquivo”, “só um firmware”, mas acabam em todo lugar, contaminando drivers, documentação, devicetrees e expectativas do ecossistema. O GNU Linux-libre 6.18 existe para mergulhar fundo e limpar essa poluição digital, mantendo o kernel compatível com as diretrizes de distribuições 100% livres.
Essa limpeza não é apenas simbólica. Em muitos drivers, o “suporte” no upstream depende de firmwares sem código-fonte e com licenças restritivas. Quando um driver tenta carregar esses blobs, o usuário é empurrado para um acordo que não pode auditar, modificar ou redistribuir. O Linux-libre corta esse caminho.
O que mudou na versão 6.18-gnu
A parte mais trabalhosa desta versão está naquilo que o projeto chama de “cleaning up news”, a lista de pontos onde o upstream mudou e o Linux-libre precisou agir rápido.
Novos drivers neutralizados
O projeto teve que “neuter”, ou seja, neutralizar, novos drivers adicionados no Linux oficial que tentariam carregar blobs se nada fosse feito. Entre eles estão drivers para amplificadores de áudio, como os da FourSemi (biblioteca e FS2104/5S) e o amplificador de alto-falante TI TAS2783, além do Qualcomm GENI Serial Engine.
Na prática, “neuter” não significa “melhorar o driver”. Significa desarmar os trechos que buscam firmware proprietário. A consequência é transparente e importante: em um sistema 100% livre, esses dispositivos podem não funcionar plenamente, justamente porque o componente não livre foi recusado.
Ajustes de limpeza em drivers que mudaram no upstream
O upstream também alterou a lógica de carregamento de blobs em áreas que já exigiam vigilância, e isso obrigou ajustes nos scripts e padrões de limpeza do Linux-libre. O anúncio cita mudanças em Intel Xe, Nova-Core, TI PRU Ethernet e Marvell WiFi-Ex, deixando claro como o “gato e rato” é constante: basta um driver mudar o jeito de pedir um blob e a limpeza precisa ser atualizada.
Devicetrees e a faxina que evita “isca” proprietária
Houve ainda limpeza em múltiplos arquivos de devicetree para dispositivos ARM64 de Qualcomm, Mediatek e TI que mencionavam blobs. Isso importa porque o devicetree não é só “metadado”, ele pode normalizar a dependência proprietária, apontando para firmwares como se fossem parte natural do suporte.
Quando o upstream remove, o Linux-libre simplifica
Nem tudo é trabalho extra. Como o driver de rádio FM TI WL1273 foi removido do upstream, o Linux-libre pôde descartar a lógica de limpeza correspondente. E, como o driver Lantiq GSWIP mudou de lugar na árvore de fontes, o projeto ajustou sua “máquina de limpeza” para acompanhar.
Um kernel, não uma distribuição, e com mudanças mínimas
O Linux-libre não é uma distro. Ele é um kernel usado por distribuições que querem ser 100% livres. E ele segue uma filosofia de minimal changes: não tenta substituir automaticamente o que foi removido por equivalentes livres. Ele remove e desativa o não livre, e incentiva que a comunidade construa alternativas.
Esse esforço tem história: o Linux-libre nasceu no ecossistema do gNewSense, ganhou fôlego com a manutenção pela FSFLA e, depois, tornou-se parte do GNU Project. E, embora o projeto diga não ter “despesas” diretas, ele reconhece a hospedagem e o suporte da Free Software Foundation (FSF), por isso incentiva doações para a FSF como forma de manter a infraestrutura viva.
