Acelerador de IA Tenstorrent Blackhole com CPUs RISC-V ganha suporte inicial no Kernel Linux para impulsionar os testes

Escrito por
Emanuel Negromonte
Emanuel Negromonte é Jornalista, Mestre em Tecnologia da Informação e atualmente cursa a segunda graduação em Engenharia de Software. Com 14 anos de experiência escrevendo sobre...

Acelerador RISC-V da Tenstorrent chega ao kernel para ampliar os testes!

O ecossistema RISC-V no Linux está prestes a ganhar um novo e poderoso aliado: a série de patches enviada por Drew Fustini (Tenstorrent) que adiciona o suporte inicial ao SoC Tenstorrent Blackhole. Na prática, isso significa que as placas PCIe de aceleração de IA da empresa, equipadas com núcleos SiFive X280, passam a ser capazes de inicializar compilações do kernel Linux mainline — um passo importante para a maturidade tanto do hardware quanto do ecossistema em torno da arquitetura aberta.

Rodando Linux em uma placa PCIe: a arquitetura Blackhole

Para entender o peso dessa novidade, é preciso olhar para a própria arquitetura do Blackhole. Diferente de uma GPU tradicional ou de um acelerador de IA fechado, o Tenstorrent Blackhole é uma placa PCIe que traz seu próprio SoC — um chip composto por quatro tiles, cada um contendo quatro núcleos SiFive X280, projetados especialmente para workloads de inteligência artificial.

O detalhe curioso é que o Linux roda diretamente nesses núcleos RISC-V embarcados na placa, enquanto um firmware separado, executado em um núcleo de gerenciamento dedicado, cuida de toda a parte de baixo nível: clocks, resets, inicialização da memória e até mesmo o controle da funcionalidade PCIe endpoint. Essa separação permite que os núcleos de computação fiquem livres para executar o kernel e as aplicações, sem se preocupar com a burocracia do hardware.

A comunicação entre o Linux rodando no Blackhole e o host acontece de uma forma engenhosa: por meio de uma UART virtual implementada em OpenSBI, que utiliza memória compartilhada. Assim, um programa de console no host consegue acessar o log de boot e interagir com o sistema remoto. Para os desenvolvedores, é como plugar um terminal serial em uma máquina que, na prática, está rodando dentro da placa PCIe.

Por que o suporte no mainline importa

O que Drew Fustini deixou claro ao propor essa série de patches é que o objetivo não é oferecer, de imediato, todas as funcionalidades do Blackhole no kernel principal. O foco inicial é permitir que o kernel Linux mainline consiga dar boot nessas placas.

“O objetivo deste Device Tree minimalista é tornar possível a inicialização de compilações do kernel mainline. Participei do recente workshop do KernelCI, e atualmente não há muitas placas RISC-V fazendo testes de boot. Acredito que as placas Blackhole podem ajudar a melhorar essa situação.” — escreveu Fustini na lista do Linux Kernel.

Ou seja: trata-se de um passo estratégico. Hoje, há poucos hardwares RISC-V sendo usados em pipelines automatizados de teste do kernel. Se as placas Blackhole entrarem nesse ciclo, cada mudança enviada ao kernel poderá ser validada também em um acelerador RISC-V de alta performance, o que fortalece a confiança de todo o ecossistema.

É importante lembrar que essa proposta foi direcionada para a versão do kernel Linux 6.17-rc5, mas como já estamos na versão rc6, é provável que a novidade seja implementada na versão final 6.17 ou no ciclo de desenvolvimento 6.18.

O que já funciona e o que ainda falta

Essa primeira leva de patches adiciona os Device Tree bindings necessários e um Device Tree básico para o SoC Blackhole. Com isso, já é possível carregar o kernel na memória da placa via host e iniciar os núcleos X280 para rodar Linux.

Mas há limitações importantes. Recursos como rede e armazenamento via virtio, que hoje existem no projeto Linux-on-Blackhole, ainda não estão prontos para o mainline. Eles dependem de mudanças no kernel downstream da Tenstorrent, e a ideia é que futuramente sejam adaptados ao padrão virtio-msg para poderem ser integrados de forma limpa ao kernel oficial.

Outro detalhe é que algumas funcionalidades usadas nos experimentos internos, como pmem para rootfs, também ficaram de fora dessa primeira série, sendo configuradas apenas via scripts no host.

Um sinal de amadurecimento para RISC-V

Ainda que o suporte inicial seja considerado “mínimo”, o valor simbólico e prático desse movimento é enorme. O fato de um acelerador de IA de ponta, como o Tenstorrent Blackhole, começar a rodar Linux mainline envia uma mensagem clara: o ecossistema RISC-V está ganhando musculatura, tanto no lado do hardware quanto no software.

Mais do que apenas mais uma linha na árvore do kernel, esse upstreaming abre espaço para que desenvolvedores, pesquisadores e empresas possam testar workloads reais em um ambiente padronizado. E, se o Linux pode rodar nesses núcleos RISC-V, qualquer um pode clonar o repositório, compilar o kernel mais recente e começar a experimentar — sem depender de versões customizadas ou hacks complicados.

No fim das contas, essa é a essência do movimento open-source: reduzir barreiras, ampliar a base de testes e garantir que tecnologias de próxima geração não fiquem presas a um canto obscuro do código. O Tenstorrent Blackhole Linux é mais um degrau na escalada do RISC-V rumo à maturidade no mundo real.

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