A violação de dados no FinWise Bank chocou o setor financeiro em 2024. Informações confidenciais de quase 700.000 clientes da American First Finance (AFF) foram acessadas de forma indevida — um incidente que expôs não apenas falhas técnicas, mas também graves deficiências humanas e processuais.
O aspecto mais alarmante desse caso não é apenas o vazamento em si, mas como ele aconteceu: o autor foi um ex-funcionário que manteve seu acesso aos sistemas por mais de um ano após seu desligamento.
Este artigo analisa o que ocorreu, por que as ameaças internas (insider threats) representam riscos tão críticos e como processos de offboarding mal executados e falta de criptografia eficaz podem transformar um erro administrativo em um desastre de segurança.
Enquanto muitas empresas concentram seus esforços em defender-se contra hackers e ataques externos, o incidente do FinWise Bank é um lembrete contundente de que as vulnerabilidades mais perigosas podem estar dentro da própria organização.
O que aconteceu na violação do FinWise bank?
O acesso não autorizado ao sistema do FinWise Bank ocorreu em 31 de maio de 2024. Um ex-funcionário, que já havia deixado a instituição, utilizou credenciais corporativas que nunca foram revogadas para acessar sistemas internos contendo dados sensíveis de clientes.
O que torna o caso ainda mais grave é o lapso de tempo: o acesso indevido só foi descoberto em 18 de junho de 2025, mais de um ano após o incidente original. Durante esse período, o ex-funcionário teve a oportunidade de explorar, copiar e possivelmente distribuir informações sigilosas sem ser detectado.
Entre os dados potencialmente comprometidos estão informações financeiras, endereços e números de identificação de aproximadamente 689.000 clientes da parceira American First Finance.
Além da falha de detecção, há indícios de que os dados não estavam devidamente criptografados, o que amplifica a gravidade do vazamento e levou o banco a enfrentar ações judiciais e investigações regulatórias.
O episódio é um alerta vermelho para o setor financeiro: mesmo instituições que cumprem normas rigorosas podem sofrer danos irreparáveis quando falham na gestão básica de acessos.

Ameaças internas: o inimigo dentro dos portões
Uma ameaça interna (insider threat) ocorre quando um risco de segurança parte de dentro da organização — seja de funcionários atuais, ex-funcionários, contratados ou parceiros.
Essas ameaças são particularmente perigosas porque envolvem pessoas que já possuem acesso legítimo aos sistemas, além de conhecerem suas vulnerabilidades. Isso torna a detecção muito mais difícil do que em ataques externos, como tentativas de phishing ou invasões automatizadas.
No caso do FinWise Bank, o ex-funcionário não precisou quebrar senhas, explorar falhas de software ou contornar firewalls. Ele simplesmente usou credenciais válidas que nunca foram desativadas — um erro de governança que abriu as portas para um dos incidentes mais graves dos últimos anos.
Esse tipo de falha mostra que as ameaças internas não são apenas uma questão de confiança, mas de processo. Quando o offboarding é negligenciado, qualquer ex-colaborador pode se tornar um vetor de risco.
A falha crítica no processo de offboarding
O offboarding é o processo formal de desligamento de um funcionário, e deveria incluir etapas rigorosas como:
- Revogação imediata de todos os acessos físicos e digitais;
- Bloqueio de credenciais corporativas e e-mails;
- Atualização de políticas de acesso em sistemas e bancos de dados;
- Auditoria de logs e monitoramento pós-desligamento.
No caso do FinWise Bank, o ex-funcionário manteve acesso ativo por mais de 12 meses — uma falha grave de Identity and Access Management (IAM).
Esse tipo de erro viola um dos princípios fundamentais da segurança da informação: o Princípio do Menor Privilégio. Segundo esse princípio, cada colaborador deve ter apenas o nível mínimo de acesso necessário para desempenhar suas funções. Após o desligamento, esse acesso deveria ser reduzido a zero imediatamente.
A ausência de um processo automatizado e auditável de revogação de acesso mostra uma lacuna de governança e de cultura de segurança. Sem controles de IAM adequados, qualquer ex-funcionário pode se tornar uma bomba-relógio silenciosa dentro da infraestrutura de TI.
Criptografia: a última linha de defesa que pode ter falhado
Mesmo que um ataque interno ocorra, a criptografia deveria ser a barreira final de proteção.
A criptografia transforma dados legíveis em um formato cifrado, ilegível para quem não possui a chave correta. Assim, mesmo que arquivos confidenciais sejam copiados, eles permanecem inúteis sem a chave de descriptografia.
Se os dados expostos no caso do FinWise Bank tivessem sido criptografados com políticas de gerenciamento adequadas, o impacto da violação teria sido drasticamente reduzido.
A importância do gerenciamento de chaves (KMS)
Criptografar é apenas o primeiro passo. O verdadeiro desafio está em gerenciar as chaves de criptografia com segurança — o que se faz por meio de um Key Management System (KMS).
As boas práticas incluem:
- Separar funções de acesso: administradores de banco de dados (DBAs) não devem ter acesso às chaves, e os administradores de segurança não devem ter acesso direto aos dados.
- Rotação periódica de chaves, garantindo que nenhuma chave seja utilizada indefinidamente.
- Auditorias regulares para detectar uso indevido ou acesso não autorizado a chaves sensíveis.
Quando essas medidas são negligenciadas, a criptografia perde sua eficácia — e é exatamente o que pode ter acontecido no caso FinWise.
A lição do FinWise
Se os sistemas do FinWise Bank tivessem implementado criptografia robusta e separação adequada de funções, o ex-funcionário poderia até ter acessado os dados, mas não conseguiria lê-los ou utilizá-los.
A falha, portanto, não foi apenas técnica, mas estrutural e processual. Mostra que segurança não é um produto, e sim um processo contínuo, que precisa ser incorporado à cultura organizacional.
Conclusão: lições aprendidas com o caso FinWise
O incidente do FinWise Bank vai além de uma simples violação de dados. Ele expõe falhas graves de governança, gestão de identidade e cultura de segurança.
A manutenção indevida de acessos, a falta de monitoramento e a possível ausência de criptografia adequada criaram o cenário perfeito para um vazamento devastador.
A principal lição é clara: a segurança da informação precisa ser pensada em camadas.
- A primeira camada é o controle de acesso rigoroso.
- A segunda, o monitoramento ativo de anomalias e logs.
- E, por fim, a criptografia, como última e mais sólida linha de defesa.
Empresas que ignoram esses pilares estão confiando demais na sorte e de menos nos processos. O caso FinWise deixa um recado inequívoco para todo o setor: a maior ameaça pode estar dentro de casa — e a melhor defesa é a prevenção.