Vulnerabilidade eSIM: Bilhões de aparelhos em risco? Entenda

Imagem do autor do SempreUpdate Jardeson Márcio
Escrito por
Jardeson Márcio
Jardeson Márcio é Jornalista e Mestre em Tecnologia Agroalimentar pela Universidade Federal da Paraíba. Com 8 anos de experiência escrevendo no SempreUpdate, Jardeson é um especialista...

Uma falha de segurança na tecnologia eSIM coloca em xeque a segurança de bilhões de dispositivos conectados. Entenda o risco.

A tecnologia eSIM já se tornou um pilar invisível da conectividade moderna. Sem a necessidade de um cartão físico, ela viabiliza a comunicação entre smartphones, relógios inteligentes, carros conectados, roteadores 5G e até sensores industriais — tudo de forma ágil e remota. Com a expansão da Internet das Coisas (IoT), o eSIM se transformou em uma peça crítica para bilhões de dispositivos.

Por isso, a recente descoberta de uma vulnerabilidade eSIM pela empresa de segurança Security Explorations, envolvendo a plataforma da Kigen, acendeu um alerta na comunidade de tecnologia e segurança digital. A falha atinge diretamente o núcleo de dispositivos modernos e pode permitir a instalação de código malicioso no chip eUICC, afetando a privacidade, identidade e até o controle sobre o dispositivo.

Este artigo explica em detalhes como essa vulnerabilidade funciona, quem está realmente em risco e o que está sendo feito para resolver o problema. Ao final, você saberá se precisa se preocupar com seu smartphone — ou com o seu carro.

eSIM
Imagem: TheHackerNews

O que é um eSIM e por que ele domina o mundo conectado?

Ao contrário dos tradicionais chips físicos (SIM cards), o eSIM é um chip embutido no dispositivo, conhecido tecnicamente como eUICC (Embedded Universal Integrated Circuit Card). Essa tecnologia permite que perfis de operadoras sejam baixados remotamente, sem a necessidade de inserir ou trocar chips.

As vantagens são muitas:

  • Troca de operadora remota, ideal para usuários que viajam com frequência ou que desejam mudar de plano sem burocracia.
  • Suporte a múltiplos perfis, o que permite alternar entre contas pessoais e corporativas, por exemplo.
  • Design compacto, essencial para dispositivos como smartwatches, rastreadores GPS, drones e sensores industriais IoT.

Por ser altamente programável, o eSIM opera com software embarcado que gerencia a autenticação, os perfis e a segurança da comunicação — e é aí que entra o papel da Kigen.

A anatomia da vulnerabilidade: como o ataque funciona

A Security Explorations, conhecida por descobrir falhas em componentes profundamente técnicos, identificou uma brecha crítica em um componente de software da Kigen, um dos principais fornecedores de tecnologia eSIM no mundo.

O ponto fraco no perfil de teste

A falha está relacionada a um perfil de teste padronizado, chamado GSMA TS.48, utilizado por fabricantes durante a validação de dispositivos com suporte a eSIM. Esse perfil deveria ser usado somente em ambiente de desenvolvimento, nunca em dispositivos finais.

O problema é que alguns dispositivos estão sendo enviados ao mercado com esse perfil de teste ativado — o que equivale a deixar uma porta de serviço aberta dentro do sistema. Essa brecha pode permitir a instalação de applets Java Card maliciosos diretamente no chip eUICC.

O que um invasor pode fazer?

A exploração dessa falha possibilita que atacantes:

  • Instalem aplicativos maliciosos no eUICC, através do uso indevido dos canais de teste do perfil GSMA TS.48.
  • Interceptem ou acessem perfis de operadoras, que em muitos casos podem ser baixados em formato de texto não criptografado.
  • Roubem certificados de identidade armazenados no chip, o que compromete a autenticação do dispositivo na rede.
  • Espionem comunicações, especialmente em dispositivos IoT sensíveis.
  • Modifiquem ou substituam perfis, podendo fazer com que uma operadora perca o controle sobre um dispositivo registrado.

Esses vetores de ataque transformam o eUICC em uma porta de entrada silenciosa, difícil de detectar e com alto potencial de abuso.

Qual o risco real para o usuário comum?

A Kigen reconheceu a falha e informou que a exploração requer acesso físico ao dispositivo. Ou seja, um hacker não pode atacar remotamente um smartphone ou relógio com essa vulnerabilidade — o que reduz, em parte, o risco para o consumidor comum.

No entanto, isso não significa que o problema seja insignificante. Pelo contrário: o requisito de acesso físico torna a falha uma ferramenta perfeita para ataques direcionados, como:

  • Espionagem industrial, especialmente em dispositivos IoT corporativos.
  • Interceptação de comunicações em carros conectados.
  • Ataques patrocinados por governos, com uso de agentes para capturar ou manipular dispositivos específicos.

Assim, ainda que o risco para o usuário médio seja moderado, organizações e alvos de alto valor devem estar em alerta máximo.

A resposta da indústria e os próximos passos

A boa notícia é que a comunidade de segurança respondeu de forma rápida e coordenada.

  • A GSMA, organização responsável pela padronização global de telecomunicações, lançou a especificação TS.48 v7.0, que mitiga a vulnerabilidade ao desativar os canais inseguros do perfil de teste.
  • A Kigen pagou uma recompensa de US$ 30.000 à Security Explorations, como parte de seu programa de bug bounty, demonstrando compromisso com a transparência e a correção da falha.
  • Fabricantes estão sendo orientados a revisar seus processos de produção, garantindo que perfis de teste nunca sejam incluídos em versões finais de produtos.

Esse caso reforça a importância de colaboração entre pesquisadores e empresas, e mostra como práticas de segurança como bug bounties podem prevenir crises maiores.

Conclusão: a segurança como um processo contínuo

A descoberta da vulnerabilidade eSIM na tecnologia da Kigen serve como mais um lembrete de que nenhum componente digital está isento de falhas. Mesmo tecnologias avançadas e amplamente adotadas, como o eSIM, podem esconder brechas perigosas.

Embora o ataque exija acesso físico e não represente um risco imediato para todos os usuários, ele tem implicações sérias para dispositivos corporativos, automotivos e IoT, onde o acesso físico pode ser viável e o impacto, devastador.

A solução já está em andamento — e isso é positivo. Mas fica o alerta: a segurança digital é um processo contínuo. É fundamental manter seus dispositivos sempre atualizados, pois correções como essa são frequentemente distribuídas por meio de atualizações de firmware ou software.

Em um mundo onde até o chip invisível do seu relógio pode ser uma ameaça, a atenção à segurança deve ser constante.

Compartilhe este artigo