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Meta lucra com anúncios fraudulentos que usam IA para roubar beneficiários do Bolsa Família, diz novo estudo

Meta anúncios fraude Brasil: investigação mostra como a plataforma lucra com golpes de crédito que usam IA e miram beneficiários do Bolsa Família e BPC.

Por
Emanuel Negromonte
Emanuel Negromonte é Jornalista, Mestre em Tecnologia da Informação e atualmente cursa a segunda graduação em Engenharia de Software. Com 14 anos de experiência escrevendo sobre...

Nos últimos doze meses, segundo o relatório “Golpinhos” do Projeto Brief, “56 milhões de brasileiros foram vítimas de algum golpe financeiro online”, com prejuízos estimados em mais de R$ 40 bilhões. Em meio a essa epidemia silenciosa, a investigação faz uma acusação direta ao coração do modelo de negócios da Meta: o ecossistema de Facebook, Instagram e WhatsApp não é só palco, mas “a principal engrenagem dessa máquina” de fraudes digitais que mira, sobretudo, quem vive de Bolsa Família, BPC e aposentadorias do INSS.

A imagem é dura. Imagine um jornal que vende páginas inteiras para agiotas e golpistas, sabe que os anúncios são problemáticos, mas os coloca na seção de “serviços sociais” e segue faturando. Quando as famílias aparecem arruinadas, a direção responde: “só vendemos espaço”. É esse “jornal cúmplice” que o Projeto Brief enxerga hoje na Meta — uma empresa que, nas palavras do relatório, “lucra com o clique, mesmo quando o clique leva ao golpe”.

A denúncia: o clique que leva ao golpe

O estudo “Fraude, IA e Dinheiro Falso: Como a Meta lucra bilhões com golpes e exploração de famílias carentes no Brasil” se debruça sobre o funcionamento concreto da máquina de anúncios da empresa. A tese central é que a Meta criou “uma estrutura publicitária que supera em muito sua capacidade de fiscalização”, em que “os anúncios fraudulentos não driblam o sistema – eles se aproveitam do modo como o sistema foi desenhado”, escrevem os autores.

Segundo o Projeto Brief, o problema não é um punhado de casos isolados: trata-se de um mercado de fraudes que opera às claras, com anúncios públicos, rastreáveis, e ainda assim aprovados, impulsionados e monetizados pela plataforma.

Os números do estudo: 16 mil anúncios e um padrão alarmante

A investigação partiu de um recorte simples: todos os anúncios ativos em setembro que continham a palavra “empréstimo” na Biblioteca de Anúncios da Meta. Foram mapeados cerca de 16 mil anúncios, número que inclui variações de segmentação e criativos duplicados. Após limpeza e desduplicação, o conjunto foi consolidado em 1.205 anúncios únicos, que serviram de universo para uma amostra probabilística com 90% de confiança e 5% de margem de erro, detalha o relatório.

A imagem abaixo foi feita pela apuração do SempreUpdate em 06/11/2025, são anúncios do relatório e seguem sendo veiculados pela Meta. Estes criativos fazem parte do relatório do Projeto Brief.

Imagem de anúncios fraudulentos veículados pela Meta
Imagem: Anúncios fraudulentos da Meta

Mas, os outros anúncios presente no relatório foram removidos, não sabemos se pelo usuário após as denúncias ou pela Meta.

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Meta lucra com anúncios fraudulentos que usam IA para roubar beneficiários do Bolsa Família, diz novo estudo 7

Mas, os anúncios desta conta você pode conferir um dos modelos na imagem abaixo:

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É dentro dessa amostra que surge o dado mais explosivo: “52% apresentava indícios de fraude; 9% eram golpes confirmados”, aponta o Projeto Brief. A maioria esmagadora das peças gira em torno de crédito consignado, “crédito para negativado” e promessas de dinheiro rápido, com foco explícito em aposentados do INSS, trabalhadores CLT e beneficiários de Bolsa Família e BPC. O relatório descreve beneficiários do programa como “vítimas frequentes de golpes na internet”, justamente por viverem em maior vulnerabilidade e alta dependência financeira.

E mais:

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A metodologia do golpe: IA, bancos falsos e funil até o WhatsApp

Ao mergulhar nos criativos, o Projeto Brief encontra uma fórmula que se repete quase como script. Em muitos casos, os anúncios exibem “imagens geradas por inteligência artificial simulando luxo e sucesso, e logos de bancos reais, como Nubank e C6 Bank”, usados para reforçar aparência de legitimidade.

Essa estética profissional vem acompanhada de promessas milimetricamente calibradas para o cotidiano de quem depende de crédito para sobreviver: “sem consulta ao SPC”, “liberação imediata”, “recuperação de valores atrasados”, “revisão do benefício”. A linguagem, diz o relatório, “revela conhecimento íntimo da realidade do tomador de crédito no Brasil” e se apoia na segmentação fina oferecida pela própria plataforma.

O passo seguinte é o funil silencioso. “Nos anúncios, há links que direcionam para o WhatsApp, páginas falsas e formulários que capturam dados pessoais, solicitando o pagamento de taxas inexistentes e lucrando com a promessa de alívio financeiro”, descreve o estudo. Lá, longe dos olhos públicos, golpistas se passam por atendentes, pegam documentos, pedem PIX e somem. Nos comentários públicos dos anúncios, o Projeto Brief observa usuários pedindo “simulação”, perguntando se “ainda dá tempo” ou relatando já terem enviado documentos — sinal de que essas peças se confundem com publicidade oficial para o cidadão comum.

Faz mais de 1 ano que o UOL Prime, canal do YouTube do UOL, revela em vídeo como funciona os detalhes dos golpes que hoje estão mais inteligentes, mediante o que vimos na denúncia do Projeto Briefing, veja:

O que a Meta admite para investidores

Enquanto isso, nos documentos enviados a reguladores e investidores nos Estados Unidos, a própria Meta traça um quadro que ajuda a entender por que “Meta anúncios fraude Brasil” não é só um rótulo de ONG, mas um problema estrutural do modelo de negócio.

No formulário 10-K de 2024 entregue à SEC, a empresa afirma que “we generate substantially all of our revenue from advertising” e que “substantially all of our revenue is currently generated from advertising on Facebook and Instagram”.(Comissão de Valores Mobiliários) Em outras palavras: quase tudo o que a Meta fatura vem de anúncios exibidos nessas duas plataformas.

Em outro trecho, a companhia admite que seus esforços em IA generativa a expõem a riscos vinculados a “harmful or illegal content, accuracy, misinformation and deepfakes (including related to elections)”, além de questões de viés, segurança, propriedade intelectual e proteção ao consumidor.

E não é só o relatório do Projeto Brief que levanta suspeitas sobre a qualidade desses anúncios. Em 2024, uma reportagem da Reuters revelou documentos internos em que a empresa projetava que “10% de sua receita de 2024” poderia vir de anúncios classificados como “outrageously bad scams” no Instagram, segundo a agência. Somados, esses elementos reforçam a tese de que o problema não está na margem, mas no centro da engrenagem.

Regulação e responsabilidade: por que o DSA entra na conversa

O relatório do Projeto Brief defende que só uma regulação robusta, nos moldes do Digital Services Act (DSA) europeu, pode forçar Big Techs a mudar sua lógica de priorizar faturamento sobre segurança. Curiosamente, a própria Meta reconhece esse risco regulatório em seu 10-K: ao listar leis que podem afetar seu negócio, a empresa cita o “Digital Services Act (DSA), which started to apply to our business as of August 2023”, destacando que a norma impõe novas restrições, custos de conformidade e “significant penalties for non-compliance”.

A companhia também informa que a Comissão Europeia abriu procedimentos formais para avaliar se ela está, de fato, identificando, avaliando e mitigando riscos sistêmicos para usuários vulneráveis em produtos como Facebook e Instagram — inclusive no que diz respeito a anúncios.

No Brasil, porém, o Projeto Brief argumenta que a Meta opera em um cenário muito mais permissivo: anúncios de “crédito fácil”, “ajuda jurídica” e falsas oportunidades ligadas a Bolsa Família e BPC continuam aparecendo em escala para quem tem menos poder de barganha e menos acesso à informação qualificada.

Como proteger quem está na ponta — enquanto nada muda

O relatório insiste que a responsabilidade principal é das plataformas e do poder público, não da vítima. Ainda assim, sugere um conjunto de atitudes de sobrevivência digital enquanto a regulação não chega. Entre elas:

  • “Observar o remetente, não a mensagem”: perfis novos, com poucos seguidores e sem selo de verificação são sinal de alerta, especialmente quando dizem representar bancos ou programas sociais.
  • Nunca compartilhar dados sensíveis: “nenhuma instituição séria solicita senhas, códigos de verificação, fotos de documentos ou comprovantes bancários por mensagem”, alertam os autores.
  • Desconfiar de qualquer promessa de benefício social por anúncio em rede social e sempre confirmar em canais oficiais, como gov.br ou assistentes oficiais do governo.

Como resumem os pesquisadores, “reconhecer esses sinais é o primeiro passo para se proteger” — mas não deveria ser o único. Enquanto o modelo de negócios continuar premiando o clique, mesmo quando o clique leva ao golpe, a conta seguirá caindo justamente sobre quem menos pode pagar.

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