O FreeBSD 15.0-RELEASE chega como um salto consistente sobre a série 14.x — daqueles que o usuário sente no dia a dia, mas que também reposicionam o sistema para a próxima década. A nova versão combina melhorias de usabilidade e desempenho no userland, avanços importantes no kernel e nos drivers, e um pacote claro de depreciações que corta arestas antigas para abrir espaço a tecnologias modernas. Em bom português: menos atrito, mais previsibilidade e um ecossistema mais fácil de manter.
Principais novidades para os usuários
Começando pelo que aparece primeiro: ferramentas clássicas ficaram mais úteis e precisas. O date(1)
agora fala a linguagem dos milissegundos e frações — suporte a nanossegundos para quem automatiza logs e auditorias de eventos; adduser(8)
passou a criar datasets ZFS por padrão para $HOME
quando o diretório-pai está em ZFS (com opção para criptografia), simplificando segurança e migrações; e o ps(1)
ganhou comportamento mais previsível (correções em -U
, reformas no -O
e remoção de colunas duplicadas) — ajustes pequenos que evitam pegadinhas em scripts e operações diárias. Até o grep(1)
agora alinha expectativa com manual: não segue symlinks por padrão em buscas recursivas.
Há também avanços de observabilidade: o dtrace(1)
consegue emitir saída em JSON, XML e HTML via libxo, tornando mais fácil integrar diagnósticos ao seu pipeline. E, no detalhe que acelera tudo, várias rotinas de libc
— aquelas de strings e memória — passaram a usar SIMD em amd64 quando disponível. Resultado? Operações comuns ficam visivelmente mais rápidas.
Na frente de software “contribuído”, o pacote base chega atualizado: OpenZFS (2.2.7), OpenSSH 9.9p2, OpenSSL 3.0 (3.0.16) e a pilha **LLVM/**Clang 19 (19.1.7) formam um conjunto atual e coeso. Em termos práticos, isso significa recursos recentes, correções de segurança já incorporadas e menos idas e vindas ao ports só para obter versões suportadas.
No ecossistema de pacotes, a equipe introduziu um repositório FreeBSD-kmods específico para 15.0 e renomeou as entradas padrão no pkg(8)
para FreeBSD-ports e FreeBSD-ports-kmods. Para quem mantém desktops com gráficos proprietários ou servidores com drivers sensíveis, isso reduz o risco de incompatibilidades de ABI entre o kernel e módulos. O instalador bsdinstall(8)
também ganhou a habilidade de baixar e instalar firmwares logo após a instalação do sistema — um alívio em notebooks e bare-metals recentes.
Avanços no kernel e suporte a hardware
No coração do sistema, o 15.0 chega com melhorias que repercutem direto na estabilidade e na performance. A pilha de som foi retrabalhada para alocar vchans sob demanda e lidar melhor com hotplug/hot-unplug (adeus travadinhas ao plugar/desplugar headsets USB). A camada LinuxKPI agora respeita __GFP_NORETRY
, o que mitiga lentidão progressiva em cenários com drm-kmod à medida que a memória física fragmenta. E a equipe adicionou um novo setcred()
com ganchos MAC para permitir ajustes de credenciais de processo de forma atômica — um ganho tanto de segurança quanto de controle fino em ambientes multi-tenant.
Drivers também evoluíram bastante. Entre os destaques:
- Rede 100GbE: driver ice(4) para a família Intel E800 atualizado (1.43.2-k) — base para links de 25/50/100Gb em datacenters.
- Wi-Fi Intel: o iwlwifi(4) recebeu uma rodada grande de correções de estabilidade.
- Wi-Fi Realtek: chegam os novos rtw88(4) e rtw89(4) (backport do Linux 6.14), cobrindo uma leva de chipsets recentes muito comuns em notebooks.
- NVMe em todo lugar:
nvme(4)
envmecontrol(8)
agora vêm habilitados em todas as arquiteturas suportadas. - ENA/BNXT/IGC: atualizações em drivers de 10/25/100/400Gb, incluindo ENA 2.8.x e melhorias em Intel igc(4)/x550, entre outros.
Na rede, além de correções e ganhos na pilha SCTP, é possível construir kernels apenas com IPv6 (sem IPv4), o ifconfig(8)
endureceu a proteção contra IPs em membros de bridge(4) por engano, e a família de drivers Intel de rede herdou AIM (Adaptive Interrupt Moderation) — mudança que, segundo os engenheiros, corrige uma regressão antiga de UDP e melhora o perfil de latência sob carga.
O suporte em nuvem ficou mais “plug and play”. O 15.0 vem com integração a cloud-init (via nuageinit e script de startup), imagens OCI oficiais, builds publicados para Oracle Cloud Infrastructure e melhorias específicas no AWS EC2 (como “shutdown/reboot” no arm64 e imagens “small” sem símbolos e depuração). Para quem vive de automação, é o tipo de ajuste que economiza horas em pipelines de provisionamento.
Modernização da plataforma e depreciações
Parte do amadurecimento é deixar coisas para trás. O gvinum(8) foi removido no 15.0 — a documentação e ferramentas passam a apontar para graid(8) e zfs(8) — e o fdisk(8) segue oficialmente depreciado em favor do gpart(8). No front de console, o histórico syscons entrou em trilho de saída (sem prazo imediato), com o projeto recomendando a migração definitiva para vt(4): o syscons não conversa bem com UEFI, não suporta UTF-8 e depende do antigo “Giant lock”. São decisões que reduzem dívida técnica e clarificam o caminho de manutenção.
Outro ponto que merece atenção do administrador: o projeto sinaliza que o caminho de atualização do base system está mudando. As notas de lançamento deixam claro que o uso do freebsd-update(8) está sendo revisto para o 15.0, com a transição para pkgbase em vista. Em termos práticos, isso significa um fluxo de updates mais granular (pacote por pacote do base), porém exige ler com calma o procedimento de upgrade da 15.0 antes de apertar “Enter” em produção.
Falando em robustez, a 15.0 consolida um grande número de advisories e erratas publicados ao longo do ciclo — de OpenSSH a xz
, de libarchive
a bugs sutis em subsistemas como ktrace(2)
e ZFS. Não é preciso decorar a lista; o recado é que a equipe vem fechando portas e polindo arestas continuamente. A relação completa e atualizada está nas páginas oficiais de advisories e erratas.
Como obter o FreeBSD 15.0
As imagens oficiais do FreeBSD 15.0-RELEASE estão disponíveis no portal do projeto e nos espelhos ao redor do mundo, com opções para instaladores tradicionais, VMs e nuvem. Antes de instalar ou atualizar, vale a rotina: conferir a página de Release Notes, ler a Errata (informações de última hora) e revisar o procedimento recomendado de upgrade — especialmente por conta da transição para pkgbase. Se o seu caso envolver drivers de terceiro ou gráficos proprietários, verifique também a configuração do repositório FreeBSD-ports-kmods.
Resumo rápido (para decidir o upgrade)
- Userland mais previsível:
date(1)
com nanossegundos,ps(1)
com semântica consistente,dtrace
com saída em JSON/XML/HTML. - Toolchain e base atualizados: OpenZFS 2.2.7, OpenSSH 9.9p2, OpenSSL 3.0.16, LLVM/Clang 19.1.7.
- Drivers e rede: ice(4) 100GbE, melhorias no iwlwifi(4), novos rtw88/rtw89, NVMe em todas as arquiteturas, AIM nos NICs Intel.
- Modernização explícita: gvinum removido; fdisk depreciado; syscons a caminho da aposentadoria em favor de vt(4).
- Caminho de update mudando: olho no pkgbase e no procedimento de upgrade da 15.0.