Kernel Linux 6.16-rc5: driver pktcdvd é removido, marcando o fim da era da gravação de pacotes em CD/DVD

Escrito por
Emanuel Negromonte
Emanuel Negromonte é Jornalista, Mestre em Tecnologia da Informação e atualmente cursa a segunda graduação em Engenharia de Software. Com 14 anos de experiência escrevendo sobre...

O fim do driver pktcdvd no Kernel Linux 6.16-rc5 simboliza o adeus definitivo à gravação de pacotes em mídias ópticas e marca mais um passo rumo a um Linux moderno, limpo e eficiente.

Com o lançamento da versão Kernel Linux 6.16-rc5, uma linha foi oficialmente traçada no passado: o driver pktcdvd foi completamente removido do código-fonte. Este evento, aparentemente técnico e discreto, marca o fim de uma tecnologia que por anos representou uma forma inovadora — ainda que complexa e controversa — de escrever dados em mídias ópticas regraváveis, como CD-RW e DVD-RW.

A exclusão não é apenas um ajuste técnico, mas um símbolo claro do compromisso do Linux em manter o código enxuto, moderno e funcional, eliminando o que não serve mais. Para entender o peso dessa mudança, é necessário revisitar o que foi essa tecnologia, por que ela caiu em desuso e qual o impacto de sua remoção no ecossistema Linux.

O que era o driver pktcdvd e a gravação de pacotes

O driver pktcdvd (abreviação de packet writing driver) era responsável por permitir a gravação de pacotes em mídias ópticas regraváveis. Ao invés de escrever dados de uma só vez em grandes blocos, como faziam os métodos tradicionais de gravação, o pktcdvd possibilitava escrever pequenos pedaços de dados incrementalmente, quase como se o CD ou DVD funcionasse como um disco rígido.

Esse comportamento foi particularmente útil em tempos em que mídias regraváveis eram usadas para backups, transporte de arquivos ou até mesmo como dispositivos de armazenamento rotineiro. Combinado com o sistema de arquivos UDF (Universal Disk Format), o driver permitia montar a mídia de forma transparente, oferecendo escrita e leitura com suporte a alterações em tempo real.

Tecnologia de gravação de pacotes: um breve histórico

A gravação de pacotes nasceu como uma resposta às limitações dos formatos ópticos. A gravação convencional exigia a finalização do disco para que ele pudesse ser lido em outros dispositivos — um processo demorado e que impedia reutilização eficiente.

Com a chegada do UDF, especialmente nas versões 1.5 e superiores, e o suporte no Linux via pktcdvd, tornou-se viável utilizar CD-RW, DVD+RW, DVD-RW e até DVD-RAM como mídias de leitura/escrita contínua. Esse modelo imitava o comportamento de um disco removível como um pendrive, oferecendo maior flexibilidade ao usuário.

Principal caso de uso: CD/DVD-RW e o sistema de arquivos UDF

O sistema de arquivos UDF, projetado inicialmente para mídias ópticas, era o parceiro ideal para o driver pktcdvd. Ele suportava metadados graváveis e permitia edições incrementais, eliminando a necessidade de regravar todo o conteúdo da mídia a cada alteração.

Juntos, pktcdvd e UDF representaram uma ponte para o armazenamento semi-volátil entre os anos 1990 e 2000, especialmente em ambientes corporativos, educacionais e de backup pessoal. Ferramentas como o K3b, NeroLinux e o comando pktsetup davam suporte à configuração e uso desse modo de gravação.

Por que o pktcdvd foi removido: obsolescência e problemas de funcionamento

Com a rápida evolução dos dispositivos de armazenamento — pendrives, discos SSD, HDDs baratos e soluções de nuvem —, a utilidade da gravação em pacotes desapareceu quase por completo. Hoje, poucas distribuições ainda oferecem suporte funcional ou ferramentas integradas para essa operação.

Além da obsolescência, o driver pktcdvd acumulava problemas: relatórios de mau funcionamento, incompatibilidades com dispositivos modernos e falhas em integrações com o subsistema de blocos e o debugfs. A remoção do driver foi assinada por Jens Axboe, principal mantenedor do subsistema de blocos do kernel, que classificou o código como “quebrado e não amado” (broken and unloved).

Um driver ‘quebrado e não amado’

A expressão usada por Axboe sintetiza o sentimento da comunidade: ninguém mais usava o driver com segurança e sua existência só atrasava o progresso técnico. O pktcdvd não era mantido ativamente, apresentava gargalos de desempenho, e gerava interações problemáticas com o sysfs e outros sistemas de arquivos modernos.

Para manter o Kernel Linux eficiente, manter um driver como esse exigiria correções profundas e uma base de testes que já não existe mais.

Gargalos de desempenho e incompatibilidades

Com as mudanças no stack de armazenamento do kernel, especialmente com a evolução de SCSI genérico, MMC/Mt Fuji, e ATAPI, o pktcdvd tornou-se cada vez mais difícil de integrar e testar. Os relatórios de bug raramente tinham resolução, e o uso em ambientes modernos resultava em falhas de escrita ou travamentos silenciosos.

O driver também apresentava incompatibilidades com ferramentas de automação de testes, o que dificultava sua validação em compilações contínuas do kernel — um ponto crítico para qualquer módulo hoje em dia.

A evolução da tecnologia de armazenamento: do CD/DVD aos SSDs e à nuvem

O mundo mudou. Hoje, com pen drives de 128 GB, SSDs NVMe ultrarrápidos e armazenamento em nuvem on-demand, o conceito de usar um CD-RW como mídia de escrita contínua parece anacrônico. O uso de mídias ópticas se limita a setores muito específicos — como arquivamento de longo prazo, automotivo ou broadcast.

A manutenção de drivers como o pktcdvd passou a ser um fardo desnecessário no projeto, sobretudo quando a própria infraestrutura de testes do kernel precisa avançar para novas frentes como ZNS, btrfs, eBPF, e virtualização com KVM e Rust.

Impacto da remoção: um kernel Linux mais enxuto e estável

A exclusão de um driver obsoleto como o pktcdvd traz benefícios concretos. Reduz-se o tamanho do código-fonte, diminuem os vetores de bugs e se libera atenção dos mantenedores para áreas mais críticas e inovadoras do kernel.

Essa prática de “limpeza de primavera” tem sido cada vez mais comum no Linux — um reflexo do compromisso do projeto com a eficiência, qualidade e manutenção sustentável de sua base de código.

Redução da carga de manutenção e eliminação de bugs

Cada linha de código no kernel exige atenção constante. Um driver que não tem usuários ativos e apresenta falhas conhecidas representa uma ameaça à estabilidade geral, mesmo sem ser diretamente utilizado.

Ao remover o pktcdvd, o time do kernel eliminou um ponto de complexidade desnecessária, reduziu a carga de manutenção, e demonstrou mais uma vez que código morto não tem lugar em um sistema que busca excelência e confiabilidade.

O compromisso do Kernel Linux com a modernização e a eficiência

A decisão de remover o driver pktcdvd reflete a filosofia que sustenta o Kernel Linux desde seu início: evoluir, depurar e manter o essencial. Não há espaço para nostalgia em um sistema que alimenta desde smartphones a supercomputadores.

O que vemos aqui é o kernel seguindo seu curso natural: modernizar-se continuamente, sem medo de deixar para trás tecnologias que já cumpriram sua missão.

Conclusão: a limpeza de código do Kernel Linux garante um futuro mais robusto e performático

A retirada do pktcdvd do Kernel Linux 6.16-rc5 é mais do que uma nota de changelog. É o fechamento de um ciclo tecnológico. Um lembrete de que a evolução exige desapego, e que a limpeza cuidadosa de código é um ato de respeito à comunidade, à manutenção e à longevidade do sistema.

Enquanto tecnologias vêm e vão, o Kernel Linux continua sua jornada como um dos projetos mais resilientes e ativos do mundo open source, sem medo de reescrever sua própria história — uma linha de código por vez.

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